Da Assinatura das Coisas – 15.3. O Cristianismo Falso e o Verdadeiro

  1. O verdadeiro pastor é aquele que entra pela porta de Cristo, que ensina pelo espírito de Cristo; fora disso, só há a forma histórica, que pretende ser suficiente para consolar; mas ela fica do lado de fora, porque ela não quer morrer a si própria pela graça.
  2. Tudo o que fala da redenção de Cristo sem ensinar a verdadeira base (que é morrer ao eu e entregar-se à obediência como uma criancinha) é exterior e não vem da porta de Cristo.
  3. Não são as consolações hipócritas que servem para qualquer coisa, é morrer com Cristo à vontade falsa, é matar incessantemente o eu terrestre e extinguir o mal que está semeado no ar.
  4. A verdadeira fé não é falar de Cristo, isso é apenas exterior; é preciso uma vontade convertida, que rejeite o mal, que se afaste dos desejos terrestres, que se afunde em Deus, que não queira sair da morte de Cristo que clama sempre: "Caro Pai, aceita por mim a obediência do Teu Filho, faz com que eu viva na Sua morte, que eu viva em Ti pela Sua humanidade, leva-me com Ele na Sua ressurreição, dá-me a Sua vida, que os Seus sofrimentos sejam meus, que eu tome a Sua força na morte e que eu seja diante de Ti como um broto da árvore que Ele é!”
  5. Tal é a verdadeira fé; o seu desejo alcança os sofrimentos de Cristo, prostra-se diante d'Ele, afunda-se na maior humildade, suporta tudo para receber a graça, toma a cruz e despreza a troça do egoísmo universal.
  6. Este desejo cresce da morte de Cristo; floresce na sua ressurreição e produz, com paciência, frutos escondidos em Deus, e que o ser humano exterior não apercebe.
  7. O verdadeiro cristão é um cavaleiro imitador de Cristo na terra. Jesus venceu a morte e introduziu a vontade humana na verdadeira obediência: isto é o que o verdadeiro cristão também deseja.
  8. Portanto, caros irmãos, acautelai-vos com o manto de púrpura; sem abandono, sem arrependimento, sem conversão, esse manto será apenas motivo de chacota; tenham cuidado com os ensinamentos pessoais e as obras de justificação particular.
  9. O verdadeiro cristão é, ele próprio, a Grande Obra que opera incessantemente na vontade de Deus, contra o desejo pessoal, apesar de ser muitas vezes frustrado pelo eu; mas ele quebra-o e verdeja como uma bela flor no Espírito divino.
  10. A cristandade tem que saber e compreender bem que, se quiser sair das vãs consolações, sem mudar a sua vontade, terá apenas uma forma exterior de regeneração. Um cristão tem que ser um espírito único com Cristo, nem a forma nem as boas palavras o ajudam, mas apenas a morte da má vontade; a ciência também não serve para nada; a sutileza das discussões é apenas um impedimento: o pastor está tão próximo de Deus quanto o doutor.
  11. A verdadeira vontade entra no Amor, ela não busca a forma, mas ela cai aos pés do seu Criador e pede a morte do eu; procura a obra do Amor contra todos, só quer florescer em Deus; toda a sua vida não passa de penitência e arrependimento, ela não busca o brilho, mas a humildade; ela considera-se indigna e o seu cristianismo está escondido dentro de si mesma.
  12. Ela diz: “Sou uma serva inútil e ainda não comecei seriamente a fazer penitência. Ela procura a porta da graça, como uma mulher nas dores do parto. O Senhor esconde-se dela para que a sua operação cresça; ela semeia com lágrimas e não vê os frutos que estão escondidos em Deus; ela corre para a meta como uma mensageira, mas não encontra descanso até que veja a pérola; e quando esta se apaga diante do eu, a aflição da alma recomeça, ela pede dia e noite, e só cessa quando as trevas desaparecem com os primeiros raios do sol nascente.
  13. Acautelai-vos portanto, caros irmãos, com as discussões eruditas; o verdadeiro cristão está morto aos desejos do seu entendimento, ele só busca a ciência do Amor e da graça; o próprio Cristo construirá a forma em Si; a forma exterior é apenas uma introdução, Deus tem que se tornar ser humano, caso contrário o ser humano não se pode tornar Deus.
  14. É por isso que um cristão é o ser humano mais simples do mundo, como diz Isaías (42,19). Todos os pagãos cobiçam a propriedade e correm para o poder e para as honras; mas um cristão só pede para morrer a isso, ele busca apenas a honra de Cristo. Tudo o que se disputa pelos prazeres da vida é pagão e mais do que pagão, é diabólico; o que saiu de Deus, para entrar no egoísmo, cobrindo-se com o manto de Cristo, é o ser humano da falsidade.
  15. Se ele quer ser um cristão, tem que morrer a este eu, e despojar-se das vestes deste mundo, onde ele não é mais que um peregrino; tem que se lembrar que é o servo de Deus e não de si mesmo. Tudo o que age por si mesmo, sem a ordem de Deus, pertence ao diabo e serve-o; adorna-te como quiseres, não vales nada diante de Deus, a tua grandeza não serve de nada diante d'Ele; tu és para ti próprio o teu próprio julgamento, que te conduz à morte; mesmo que fosses rei, não passas dum servo e tens que passar com os mais miseráveis, pela regeneração, sem a qual não verás Deus.
  16. Todo poder próprio, pelo qual os pobres são oprimidos, pertence ao egoísmo e nasce da forma pronunciada que se particularizou e saiu de Deus. Tudo o que não serve Deus é falso, quer seja alto ou baixo, sábio ou ignorante; nós somos todos servos de Deus; nada se torna algo pessoal, que não nasça pela Cólera de Deus na impressão da Natureza.
  17. Se um cristão possui qualquer coisa de verdadeiro em si mesmo, não deixa de ser senão um intendente do Senhor; tudo aquilo que ele quisesse relacionar ao egoísmo, o conduziria à prisão da avareza, da inveja, da carne, e o faria extorquir os bens que Deus lhe confiou para gerir.
  18. O verdadeiro cristão não tem nada de próprio; quer procure, quer plante, quer construa, quer faça aquilo que quer, deve saber que é a Deus que ele o faz, e que é a Ele que tem que prestar contas disso; se ele se preocupa com o que os seus companheiros andam a fazer, nos prazeres deste mundo, ele ainda está longe do reino de Deus, não se pode chamar em consciência de cristão, ainda está apenas na forma do cristianismo e não no Espírito de Cristo; a forma desaparecerá com o tempo, somente o Espírito permanecerá eternamente.
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