Da Assinatura das Coisas – 11.1. O Fogo e a Luz

CAPÍTULO DÉCIMO PRIMEIRO

DOS SOFRIMENTOS, MORTE E RESSURREIÇÃO DE CRISTO; DO MILAGRE DO SEXTO REINO E DA CONSUMAÇÃO DA OBRA

Resumo: - O fogo e a luz - A ação de Cristo - Sua paixão simbólica - Unificação do Amor e da Cólera - A vitória sobre a morte no ser humano, no atanor alquímico

  1. Nós aprendemos que a essência deste mundo e do ser humano compreende duas propriedades, a do fogo e a da luz. O fogo pode ser o fogo frio da impressão ou o da revolução mercuriana no enxofre; o fogo frio possui uma luz fria e má, e o fogo quente tem uma luz quente e boa.
  2. Essa luz só é má porque, na impressão sulfurosa, ela azeda de fúria, porque o seu desejo é Saturno e Marte. A outra luz que também recebe a sua acuidade ígnea na impressão do Enxofre marciano, leva o seu desejo à Liberdade morrendo ao fogo pela angústia; ela perde as suas qualidades próprias e torna-se como que num Sol que espalha o seu esplendor indiscriminadamente sobre todas as criaturas.
  3. O esplendor do Sol não é nem quente nem frio; é o Mercúrio do espírito do grande mundo que produz em Marte e Saturno um calor ao qual o Sol acende a sua avidez; este calor não é próprio da Luz, mas pertence à alma do mundo que excita a luz até que se torne insuportável aos olhos.
  4. Se uma outra avidez ígnea, não parecida com a vida exterior do Mercúrio, quisesse dominar na fúria severa da Natureza exterior, produziria um antagonismo com o regime frio e amargo; é o que acontece quando o desejo divino de amor com a sua suavidade encontra a avidez ígnea, falsa, fria, severa e orgulhosa de Saturno, Marte e do falso Mercúrio; é a grande luta do Amor que quer dominar a morte; o céu desce ao inferno, e eles lutam entre si como se vê no exemplo de Cristo. Ele amou os seres humanos, fez-lhes bem, curou-os, mas como ele não se originou no poder furioso deles, e como ele veio do alto, o fogo frio e consumidor não quis recebê-lo.
  5. Da mesma forma, na obra alquímica, quando as formas furiosas: Saturno, Marte e Mercúrio externos, vêem por baixo delas o cavaleiro celeste1 com a sua qualidade virginal e sentem que ele tem um desejo diferente do desejo delas, enfurecem-se; porque, quando o relâmpago ígneo avista o Amor, ele desperta, a fúria sai da angústia para entrar no Amor, e este entra em agonia; mas como não pode morrer, afunda-se no fogo, abisma-se nele, e torna-se num veneno para a morte; assim, o inferno perde o seu império sobre a humanidade; quando Cristo derramou o seu sangue celeste no pavor da morte, a Cólera teve que guardar dentro de si a essência do Amor. Assim, a avidez ígnea na propriedade humana foi transmutada em desejo de Amor, e a alegria do poder divino nasceu da angústia da morte.
  6. O amador deve compreender plenamente que o processo de Cristo é um com o da obra filosófica. Cristo venceu a morte e converteu a Cólera em Amor no ser humano. O Filósofo deve fazer o mesmo. Ele tem que reduzir a terra furiosa a um céu, transformar o Mercúrio venenoso em Amor. Não estamos aqui a fazer uma parábola, notem bem isto.
  7. Depois que a humanidade se tornou terrestre ou que despertou o Mercúrio venenoso que engolfou o Amor, Deus quis transmutá-lo novamente em Amor, refazer um Céu com a terra humana, devolver os quatro elementos ao elemento único e mudar a sua cólera no ser humano em Amor.
  8. Essa Cólera era uma força de fogo e de fúria acesa em nós; transformá-la em Amor é um trabalho árduo; é preciso que o Amor desça na Cólera, se abandone de antemão a ela: não teria servido de nada que Deus permanecesse no céu a olhar lá de cima para o ser humano com piedade; não é assim que a fúria teria sido despojada do seu poder; da mesma forma, se o fogo só for separado da luz, ainda conserva o seu ardor; para que ele se extingua, é preciso uma essência suave como a água.
  9. Assim, a essência divina, a água celeste, que transforma em sangue a Tintura de fogo e de luz, deve descer na Cólera, tornar-se seu alimento, para que o seu fogo se alimente dela, porque não pode sustentar-se de água. O fogo não arde na água, mas no óleo suave do fogo e da luz segundo a essência da suavidade divina. Assim fez Deus.2
  10. O fogo da vida humana reside no sangue; é governado pela Cólera divina. Um outro sangue, nascido do Amor, tem que entrar no sangue humano colérico e na fúria da morte para afogá-la. É por isso que a humanidade exterior de Cristo teve que morrer à Cólera divina, para que o sangue celeste de Mercúrio, ou Verbo pronunciador na humanidade exterior, possa viver sozinho, segundo o poder divino, no ser humano inteiro, externo e interno; — para que cesse o egoísmo humano, para que o Espírito seja tudo em todos; a vontade própria também tem que morrer e ser reduzida a ser apenas o instrumento do Espírito de Deus; porque o ser humano não foi criado como senhor da ipseidade, mas como servidor do Senhor; Deus quis ser obedecido pelos anjos, não castigar diabos na potência ígnea.

Notas

  1. O Cavaleiro, a criança, o leão: é o princípio regenerador da matéria – é Cristo no ser humano. — A virgem: é a sabedoria em nós; é Vénus, na matéria: ela é a mãe da criança e a sua esposa quando ele cresce. [  ]
  2. Os princípios do mundo físico sob as três primeiras formas: 1) adstringência, 2) amargura, 3) angústia ou 1) Saturno, 2) Marte e 3) Mercúrio: este último está compreendido tanto como o Mercúrio planetário quanto o Mercúrio princípio dos alquimistas. — Os princípios da regeneração são: uma essência suave, a Virgem, contendo dentro dela o menino Jesus invisível, em germe; e agindo sobre a tintura celeste que, embora sufocada, persiste em germe, no fundo do mineral ou no centro do coração humano. [  ]
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