Da Assinatura das Coisas – 7.6. O Processo Alquímico e de Cristo
Processo1
- Na geração, cada Género busca o seu complemento. Ora, Deus disse a Adão e a Eva, após a queda: “A semente da Mulher esmagará a cabeça da serpente”; Ele não estava a falar da semente do ser humano: aqui está o Batismo da Natureza: o Macho possui o Espírito ígneo e a fêmea o Espírito aquoso; ora, o Mercúrio é uma vida ígnea e faz um corpo para si segundo a sua fome; portanto, no início, basta dar à fome ígnea uma companheira amorosa para que os beijos dela lhe façam conhecer o amor.
- O Diabo é o inimigo dessas núpcias; ele insinua nesses esposos uma falsa alegria; de modo que, se eles puserem o seu desejo na vontade dele, eles se odiarão um ao outro e gerarão um filho falso; porque, uma árvore má dá frutos maus e uma árvore boa dá frutos bons, disse o Cristo.
- O Artista deve precaver-se contra uma tal cólera ao mesmo tempo que prepara tribulações para esse casal (porque ele é ao mesmo tempo seu inimigo e seu amigo): eles devem elevar o seu desejo para Deus afim de gerarem a sua essência e de a guardar no seu seio até que ela esteja madura.
- A mãe, durante toda a gestação, só deve pensar no marido, não imaginar coisas estranhas, caso contrário ela imprime uma marca na criança. Assim, portanto, é preciso que o nosso casal permaneça simplesmente no Amor, até que a criança seja corporalmente perfeita: o que ocorre na quarta lua. A criança recebe a vida da alma na sua essência como um combate; conforme a qualidade dos pais, o artista deve socorrer a propriedade ígnea da alma, até que ela receba a sua vida e se manifeste numa forma feminina.
- Ela adquire ainda um pouco mais de forças até se revestir com um vestido vermelho e branco. Resta ainda a rejeição da vida vegetativa dos pais, após a qual os quatro elementos morrem; a vida então surge no elemento único; durante esses fenómenos, a Criança permanece escondida na escuridão da morte: o artista acredita que está perdida, mas deve ser paciente.
Formação da Criança Mágica2
- A vida terrestre de Cristo é uma figura verdadeira da nutrição da nova criança no seio materno após a sua concepção, desde a sua vida vegetativa até ao momento em que recebe a verdadeira vida da Alma e do corpo, pela influência do Espírito; segundo o externo, o rebento é mais nobre do que os seus pais.
- Mas talvez algum sofista grosseiro venha tirar uma interpretação estranha deste livro. Quando eu falo duma Alma de vida vegetativa, que ele saiba que eu não me refiro à imagem de Deus nos metais, nas pedras e nas ervas, mas à Alma mágica pela qual a eternidade é representada em todas as coisas, segundo a Sabedoria.
- Quando Cristo atingiu, nas propriedades divina e humana, a idade de doze anos, ele foi, com a sua mãe Maria, a Jerusalém; ele entrou no templo, ouviu os Escribas, dando respostas aos eruditos; mas, enquanto os seus pais voltavam, pensando em encontrá-lo com os seus companheiros, ele ficou com os eruditos, segundo a vontade divina; e à sua mãe ele respondeu assim: “Por que é que me procuravam? Não sabiam que eu tinha de tratar dos assuntos de meu Pai?" E, no entanto, ele vivia com eles e sujeitava-se a eles.
- Esta palavra dá-nos a imagem das Vontades dos mundos interior e exterior, contidos um dentro do outro e opostos um ao outro, mas no entanto sendo só um; assim, em Cristo, dois reinos são manifestados; um operando na vontade de Deus e rompendo a vontade exterior dos pais, e o outro, pelo contrário, obedecendo aos pais.
- Esta figura mostra ao mago que ele se encontrará na presença de duas vontades: uma não estará sujeita a ele, é a divina; e quando a segunda, a sua própria vontade exterior, buscar com Maria o amável Jesus, na dor, é então que a primeira se submeterá a ele.
- Em segundo lugar, nós vemos por isso que em todas as coisas esses dois tipos de operações são encontrados; e se queremos ser um mago e voltar a vontade e a essência da boa propriedade do interior para o exterior, é preciso primeiro ser capaz da vontade divina, caso contrário essa transmutação torna-se impossível. Assim, Cristo não estava sujeito à vontade exterior da sua mãe; a sua vontade estava de acordo com a vontade de Deus, e elas lutaram em conjunto, como Jacó com o anjo. Então Deus disse-lhe: "Tu lutaste contra Deus e contra os homens e saíste vencedor."
- O Mago também deve saber que não deve implantar pelo exterior o seu desejo de perfeição; que ele exerça apenas uma vontade adequada à propriedade da coisa que ele quer tratar, que ele lute como Jacó com a vontade divina e que ele abençoe a vontade aspirante. Que a vontade divina se renda à fome que a deseja; e que ela torne perfeita a vontade que penetra até à piedade; então, poderemos dizer: Tu lutaste contra Deus e obtiveste a vitória; e o objeto receberá um corpo transmutado, terrestre e celeste.
- Observa isto: é o começo do Batismo; e sem isto tu só batizarás com a água do mundo exterior; mas o verdadeiro Mago batiza com a Água interior e exterior. Quando ele gera um desejo verdadeiramente divino, a vontade divina do seu batismo é a primeira centelha do Mercúrio; a vida começa a mover a morte; o Mercúrio morto tem fome da Essência divina e realiza o seu primeiro milagre, que é o das bodas de Caná: é a primeira tintura da vida vegetativa, quer dizer, uma fome amorosa que envolve a fonte ígnea e transforma em fogo luminoso a fúria e a vontade fria da morte; a água mortal torna-se em vinho, ou seja, numa acuidade ígnea e aquosa que termina, segundo o empreendimento do artista, num óleo, resultante do modo de união dos dois noivos; Cristo, que é o esposo, foi levado ao deserto e tentado pelo diabo.
- É a renovação da prova paradisíaca quer para o Artista quer para o esposo. Se o esposo deseja a Virgem, ela dá-lhe o seu coração e a sua vontade; esta é a tintura celeste com a qual o Mercúrio está impregnado, inflamado na cólera de Deus e comprimido na morte, isto é, na maldição da terra; e este Mercúrio é o esposo. Porque a semente da mulher, a tintura celeste, deve esmagar a cabeça da serpente, ou seja, transformar o veneno da morte em vinho: é então que a Virgem recebe o beijo do Esposo.
- O deserto significa o corpo terrestre onde o Mercúrio é provado pelo diabo que excita a sua essência ígnea; a Virgem então vem reconfortar o esposo com o seu amor; assim o Mercúrio pode subsistir diante desse diabo e os anjos finalmente aproximam-se dele para servi-lo. O Mago sabe o que quero dizer com diabo.
- O Mago deve abordar este empreendimento com todo o cuidado; quando, depois de quarenta dias, os anjos não aparecem, tudo o que ele empreendeu é inútil; que ele tenha cuidado para não ter um diabo muito furioso ou muito fraco com quem combater, porque o Mercúrio se iluminaria e tenderia a permanecer na sua propriedade venenosa, anulando assim o efeito do Batismo.
- Logo que o Mago vê os anjos, que ele conduza Cristo para fora do deserto, e que deixe o noivo novamente alimentar-se da sua própria carne: então Cristo fará muitos milagres que alegrarão e surpreenderão o coração do Artista.
- Ele não tem mais nada a fazer: a esposa está no marido; casados um com o outro, eles só precisam do seu leito nupcial: eles abraçam-se um ao outro, alimentando-se reciprocamente com a sua própria carne, até que a criança seja concebida. Se o artista quer cuidar deles a ponto de fazer e aquecer a cama deles, deve ter o cuidado para não perturbar o seu amor. O Noivo tem sempre dois tipos de vontades: uma fome terrestre da cólera de Deus e uma fome da esposa: devemos então alimentá-lo com carne terrestre, mas magicamente, para apaziguar a sua vontade faminta: Esta carne é a mãe que o gerou, como vimos acima.
- Em suma, a obra toda consiste em duas coisas: uma celeste e outra terrestre; a celeste deve absorver a terrestre, a Eternidade deve fazer do tempo uma eternidade; o artista busca o paraíso: se o encontra, possui o maior tesouro da terra; mas uma morte não desperta outra. O Artista tem que viver, se quiser dizer à Montanha: Levanta-te e lança-te ao Mar.
- Quando começa a corporificação da criança, Saturno pega nela e lança-a nas trevas; é aqui que Cristo caminha sobre a terra como um estrangeiro, não tendo senão em Saturno uma pedra para repousar a cabeça.
- Em seguida, a Lua apodera-se dela; ela mistura as propriedades celestes e terrestres; a vida vegetativa manifesta-se; mas ainda há um perigo a ser superado.
- Depois da Lua, Júpiter faz à Vida uma morada em Mercúrio; este faz a criança tomar o movimento da roda que o eleva à mais alta angústia onde Marte fornece ao Mercúrio a sua alma ígnea; em Marte acende-se a vida mais sublime, separada em duas essências: um corpo de amor e um espírito de fogo. A vida amorosa desmaia na efervescência ígnea inferior e aparece em toda a sua beleza; mas Mercúrio engole esta Vénus. A criança então torna-se num corvo negro, e Marte oprime o Mercúrio até à morte: os quatro elementos saem então dele, e o Sol, tomando a criança, apresenta-a no seu corpo virginal ao elemento puro: na propriedade de Marte, a Luz acende-se, a verdadeira vida do elemento único nasce contra a qual nem a cólera nem a morte podem fazer nada.
- Pode parecer estranho aos olhos da razão que Deus faça o ser humano seguir um tal processo para se regenerar, e que ele tenha deixado Cristo ser desprezado, caluniado, rejeitado e crucificado, e depois vagando por quarenta dias sobre a terra antes de admiti-lo no seu reino invisível.
- A razão é tão cega que não entende nada das coisas eternas. Ela não sabe nada do Paraíso, da condição de Adão, da sua queda, da maldição da terra: se ela entendesse essas coisas, ela também compreenderia a via da regeneração. Não há diferença entre o nascimento eterno, a reintegração e a descoberta da Pedra filosofal. Tendo tudo saído da eternidade, tudo para lá deve retornar da mesma maneira.
- Se o mago quer buscar o Paraíso na maldição da terra, tem que conformar-se ao modelo que lhe foi oferecido por Cristo; Deus tem que se manifestar nele; só então ele consegue encontrar aquele Paraíso onde não há mais morte.
- Mas se ele próprio não seguir no caminho da restauração, que Cristo seguiu nesta terra, que abandone o seu empreendimento, porque só encontrará a morte e a maldição de Deus: é disso que eu o advirto fielmente; porque a nobre Pérola é paradisíaca; Deus não a lança aos porcos, mas dá-a aos seus filhos como sinal de amor. O ímpio não é digno do Paraíso, a Jóia celeste não lhe será dada; é por isso que Deus a esconde, permitindo que aquele que a possui apenas fale dela de maneira mágica.
- É por isso que ninguém consegue alcançá-la, a menos que seja primeiro um mago perfeito, e se o Paraíso ainda não se manifestou nele é porque somente aqueles que são eleitos por Deus lá chegam.
Notas
- Tudo isto é obscuro quanto ao lado alquímico; na verdade, a maioria dos processos de laboratório são falsos, tiranizando a matéria; enquanto que o verdadeiro processo deve fazê-la evoluir de forma saudável: este processo só pode ser conhecido por aquele que já realizou a grande obra em si mesmo. Os esforços dos nossos químicos e alquimistas atuais são, portanto, vãos e falsos. [ ↑ ]
- Mágica: invisível, potencial, oculta, ainda não manifestada. A alquimia não consiste apenas em fazer ouro, mas em evoluir toda a matéria para o seu estado perfeito. Para isso, dada uma substância qualquer, devemos discernir, por meio do conhecimento teórico que o estudo e a intuição nos fornecem, qual é a sua assinatura, de que forças invisíveis ela é o corpo; depois, extrair outra, com propriedades complementares: estas serão o masculino e o feminino. Boehme detalha a série de cores que devem ser obtidas trabalhando em qualquer corpo; mas ele insiste na necessidade de nós próprios sermos regenerados previamente, antes de podermos regenerar à nossa volta. Com efeito, o nosso estado de alma é radiante, ele influencia o ambiente, ele modifica o nosso destino, as nossas relações, os seres e as coisas que nos são enviadas; de modo que um coração puro só atrai para si aquilo que há de puro no mundo, e assim o seu trabalho torna-se mais fácil e verdadeiro. [ ↑ ]
- Para a interpretação de todo este capítulo, do ponto de vista do grande trabalho psíquico, substitua o Mercúrio pela angústia moral; e veja na luta contra a morte, a luta contra as paixões do Eu. O pai da Criança é o Eu e a sua mãe é a imaginação colocada no Amor ou em Jesus Cristo. [ ↑ ]
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