Da Assinatura das Coisas – 10.1. Os Três Mundos no Ser Humano

CAPÍTULO DÉCIMO

DA CURA INTERIOR E EXTERIOR DO SER HUMANO

Resumo: — Os três mundos no ser humano — O processo de Cristo, espelho do Universal — A fé — As tentações — A Virgem filosófica — Os planetas e a cura interior do Ser Humano; dos primeiros cinco períodos desta cura na Alquimia

  1. Que o amante das coisas divinas saiba bem que o nosso caminho não é histórico nem pagão; mas que nos estamos a dirigir na direção da luz da natureza exterior; para nós, brilham os dois Sóis. Nós queremos explicar como Deus curou o ser humano do veneno da Serpente e do veneno do Diabo, e como ainda hoje cura a pobre alma prisioneira da cólera divina.
  2. A luz e o amor divinos extinguiram-se em Adão quando ele imaginou na propriedade da serpente, igualmente propícia ao mal e ao bem; o veneno mortal do Mercúrio começou a agir desde então; Marte tornou ardente a fonte da Cólera, a impressão tenebrosa da Natureza tornou terrestre o corpo, e o veneno de Mercúrio declarou a inimizade entre Deus e a sua criatura; estava tudo acabado com ela a partir daquele momento, a morte furiosa tomou conta do seu corpo e da sua alma.1
  3. Como fez Deus para a curar e tingir de novo? Ele usou um remédio estrangeiro? Não, ele usou uma coisa análoga, o Mercúrio, a Vénus e o Júpiter divinos. No ser humano estava o verbo pronunciado; é o que eu chamo de Mercúrio eterno, porque é a vida que Deus insuflou na sua imagem. A Alma dessa imagem compreendia as propriedades dos três mundos:
  4. O mundo da Luz, que é o entendimento e que é Deus; o mundo ígneo, que é a Natureza eterna do Pai das essências, e o mundo do Amor, que é o da corporalidade celeste. Na essência do Amor, o Mercúrio é a Palavra de Deus, e na essência ígnea, ele é a fúria de Deus, o princípio do movimento, do combate e da força. A propriedade ígnea dá o desejo à luz e à liberdade; o nada então deseja, e esse desejo é o amor de Deus que Adão extinguiu ao imaginar no terrestre.
  5. A propriedade ígnea saiu da essência da fúria e do amor, pelo movimento divino, para que as maravilhas do abismo e da base se manifestassem, para que o bem e o mal fossem descobertos, Deus criou Adão à sua imagem para tingir o mundo ígneo e exterior com a palavra do amor.
  6. Mas Adão despertou nele, pela sua falsa imaginação, o mundo ígneo mercuriano, tenebroso e venenoso; a sua essência corporal da impressão caiu na parte venenosa da propriedade mercurial, e a Alma manifestou-se na natureza eterna na propriedade ígnea do Pai, de acordo com esse Mercúrio venenoso, esse Deus ciumento e vingativo, e esse fogo consumidor.
  7. Ora, para socorrer Adão, foi preciso que Deus lhe administrasse o remédio análogo ao excesso, causa da sua doença. Aqui está como foi feito.
  8. Ele recolocou o Mercúrio santo na chama do Amor com o desejo da essência divina no verbo pronunciado, ou seja na alma ígnea de Mercúrio;2 ele tingiu esse veneno, a fúria do Pai de todas as essências, por meio do fogo do amor, e trazendo de volta esse Mercúrio com a luz do Sol eterno ou amor, tingiu com ele a fúria do Mercúrio irritado da propriedade humana: por forma que Júpiter, o entendimento divino, pudesse regressar ao seu caminho.
  9. Se vocês não compreenderem isto, vocês, médicos, estão presos no veneno do Diabo; vejam de que maneira é preciso socorrer a irritação do Mercúrio no ser humano; deve ser feito por meio dum Mercúrio iluminado pelo Sol em Júpiter e em Vénus. Assim como Deus age conosco, pobres pecadores, também os enfermos devem ser curados pela suavidade amorosa; não se deve usar a impressão fria e escura de Saturno sem que o Sol tenha entrado nela pela sua reconciliação com Júpiter e Vénus. Desta forma, a vida pode surgir da morte; esta é a cura vulgar e simples.

Notas

  1. Podemos consultar, para uma outra forma de ver o movimento desses dois princípios, as antigas iniciações politeístas: Hesíodo, Orfeu, etc. Veja a sua apresentação em J.-B. Pernéty, e especialmente nas obras raríssimas de J.-Fr. Delaulnaye. [ ↑ ]
  2. Na essência anímica de Maria, concebida cosmogonicamente como espelho da divindade, esposa de Deus, se ousamos dizer. Veja a iniciação bramânica. [ ↑ ]
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