Da Assinatura das Coisas – 6.2. A Água e o Óleo

  1. Quando o desejo livre se rende à fome cúpida, esta reproduz uma imagem dele que consiste numa água e num óleo. Mas como a avidez, isto é, a fome de liberdade é satisfeita, ela também produz, de acordo com a sua propriedade, uma essência, que é água, enquanto que a essência do desejo livre é óleo. Assim, num único espírito se manifestam dois tipos de propriedades: uma ígnea de acordo com a avidez e uma luminosa alegre de acordo com a liberdade.1
  2. O ígneo dá, na sua essência, na sua água, um sal agudo de avidez, e na sua angústia, um enxofre do qual provêm, na criação, os Elementos e as estrelas, as pedras e os metais, segundo as formas do desejo, e a corporalidade; e o óleo dá a sua suavidade, como um prazer gratuito de amor, que faz a vida crescer na impressão ígnea; mas, para isso, é necessário o aguilhão do fogo, o separador das corporalidades, causa da essência e da multiplicidade.
  3. Os Sábios chamaram, a esta forma de Mercúrio, de roda da Angústia, causa de toda a vida e de todo o movimento, e arquiteta nas propriedades oleosas e aquosas.
  4. Procuremos como há, em todas as coisas: o óleo, o enxofre e o sal, e como eles se originam.2 Deus fez todas as coisas a partir do nada, isto é, de si mesmo: um desejo amoroso, mas não passional, habita nele; mas esse desejo não se manifestaria se permanecesse silencioso, sem essência.
  5. Quando ele se introduz na essência pela avidez, esse silêncio eterno torna-se numa essência eficaz, com duas propriedades. A primeira é um óleo, cuja virtude efetiva é boa, amorosa e resistente à fúria do enxofre, do sal e do mercúrio venenoso, que ela cura pela sua suavidade, assim como os danos causados pela roda própria do mercúrio; assim, o bem e o mal estão em cada vida.
  6. Não há mal nenhum, porém, a menos que o óleo pereça por fraqueza no seu próprio prazer nas formas impressas pela fome do desejo. Quando o espírito faminto se afirma com muita força e se manifesta com muita fúria, ele não consegue mais receber o prazer livre que teria saciado a sua fome. Quando a fome recebe o amor nela e forma uma essência, ela deixa de ser tenebrosa, picante e venenosamente mercurial, mas ela torna-se num desejo amoroso e toma o nome de natureza divina; enquanto que antes ela era a cólera de Deus, o fogo na natureza exterior.
  7. A avidez, que atua no mundo interior, na propriedade do prazer livre, arde com os fogos do amor divino, o desejo substitui a avidez e produz a plenitude da alegria: o que só pode acontecer onde há movimento.
  8. O desejo livre, que é a propriedade de Deus, manifesta-se, portanto, pela propriedade ígnea; por esta última, igualmente, o óleo que é a essência do prazer, e que brota da impressão da avidez, adquire esplendor; a austeridade dá o relâmpago angustiado (o espírito do 🜔 (Sal)) e a suavidade do óleo, pelo seu amor, afugenta as trevas e manifesta o nada da liberdade eterna.
  9. Quando o esplendor ígneo saboreia a suavidade da Luz, a avidez ígnea apodera-se da suavidade; esse prazer livre é um nada incompreensível; a fome da avidez faz, da sua essência, a escuridão ao devorar-se a si mesma, e a propriedade da luz absorve essas trevas como se vê no dia e na noite.3

Notas

  1. Para fixar as ideias, podemos aplicar estas teorias à matéria-prima cósmica da qual se seguem as mutações até aos três princípios dos hermetistas. [  ]
  2. O desejo tende para tudo e para nada, é essencial, e dá o óleo; a avidez é individualizante, natural, e dá o Fogo; e isto em todos os planos, desde a matéria-prima divina ou Natureza essência, até à matéria da nossa terra. Quando a avidez se apodera do desejo, dá uma água invisível que contém uma tendência para a matéria (Sal) e uma alma de fogo (enxofre); todos os seres possuem neles esses dois princípios e o seu motor, o Mercúrio. Todas as substâncias vêm do Sal: há, portanto, sais divinos, angélicos, astrais, anímicos, magnéticos, minerais, etc., e em cada um deles um desejo e uma avidez; aqui, os sais do desejo, onde as moléculas são irradiantes, produzem metais e vegetais; mas aqueles, cujo lado etérico é absorvente, produzem a terra e as águas. Em todos os óleos há um espírito de desejo e um sal corporisante; no ser humano, o óleo é o alimento do fogo vital ou Mercúrio; da sua corrupção vem a doença. [  ]
  3. Ver Pernety, Dicionário Mito-Hermético, Saturno,4 Vulcano.5 ]
  4. «SATURNO: Entre os Químicos vulgares, é o chumbo. Os Filósofos Herméticos dão o nome de Saturno a várias coisas.
    A primeira é a cor preta, ou a matéria chegada a essa cor pela dissolução e pela putrefação.
    A segunda é o chumbo comum, o mais imperfeito dos metais, e por isso o mais afastado da matéria da Grande Obra. Tenha cuidado, diz Ripley, ao trabalhar sobre o Saturno vulgar, porque se diz que não se deve comer do filho cuja mãe é corrupta; e acreditem em mim, muitas pessoas caem no erro ao trabalharem no Saturno. Saturno sempre será Saturno, diz Avicena. Ripley, Philorcii, cap. 1.
    A terceira é o Adrop dos Sábios, ou Vitriol azocado de Raimundo Lúlio.
    A quarta é o cobre comum, o primeiro dos metais, como afirma Arnaldo de Vilanova no seu Espelho da Alquimia, disp. 8, vol. 4, do Teatro Químico. Vários Filósofos, diz ele, praticaram a sua ciência sobre os planetas; e o nosso primeiro planeta chama-se Vénus, o segundo Saturno, o terceiro Mercúrio, o quarto Marte, o quinto Júpiter, o sexto Lua e o sétimo Sol. Basilio Valentim diz que a geração do cobre segue imediatamente ou ocupa o primeiro lugar depois do Mercúrio. Bas. de rebus Nat. et super. Nat. c. 4. Nada, diz Paracelso (Lib. 4, Philos, de Elemento Aquæ), tem mais afinidade com os minerais do que o vitríolo. O vitríolo é o último na separação dos minerais, e a geração dos metais segue imediatamente a sua, entre os quais o cobre ocupa o primeiro lugar.
    A quinta nada mais é do que a preparação filosófica do cobre filosófico, por meio da menstruação vegetal; o que lhe deu o nome de Planta saturniana vegetal, para distingui-la do cobre antes da sua preparação. Mas esta menstruação vegetal é a menstruação filosófica.
    Muitos tomaram o antimónio pelo chumbo dos Sábios, tanto por causa dos elogios que vários Autores dão a este mineral, como porque alguns deles o nomeiam ou parecem indicá-lo para a matéria da qual é necessário extrair o Mercúrio dos Filósofos. Artephius chama a esta matéria de Antimónio das partes de Saturno, e ao seu mercúrio de Vinagre antimonial saturniano. Mas ele explica-se em seguida dizendo que chama a essa matéria de Antimónio, porque ela tem as propriedades deste. O maior número chama-lhe de Raça de Saturno e de Saturnia vegetal. Mas em vão se procuraria substituir o mercúrio extraído do chumbo pelo mercúrio vulgar, pois seria menos puro do que o chumbo, e por isso mesmo estaria ainda mais afastado da Obra. É preciso encontrar uma matéria que tenha a propriedade de purificar e fixar o mercúrio. Os Sábios, diz Philalethes, procuraram-na na raça de Saturno e encontraram-na ali, acrescentando-lhe um enxofre metálico que lhe faltava.» Pernety, Dicionário Mito-Hermético, Saturno. (NDTP) [  ]
  5. «VULCANO: Não é de surpreender que Vulcano tenha sido considerado o Deus daqueles que trabalham com os metais, porque ele é o próprio fogo que os forma nas entranhas da terra. As obras-primas atribuídas a ele são obras puramente fabulosas que indicam as qualidades deste Deus, e a própria maneira de representá-lo com um gorro azul é bastante notável. Não seria pelo mesmo motivo que Naptuno recebeu uma espécie de manto azul? Vulcano é o fogo dos Filósofos Herméticos; é por isso que Hermes e os Egípcios o tinham em tão grande veneração.» Pernety, Dicionário Mito-Hermético, Vulcano. (NDTP) [  ]
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